Cizur Menor a Cirauqui. 30 km. 7h50 às 17h40.
Continuando...
Ao longo do dia,
eu não encontrava Hwang (a coreana do tênis) e comecei a me preocupar um pouco,
já que eu não sabia se ela tinha me dado o tênis mesmo ou se tinha sido só um
empréstimo. Além disso, eu não queria ficar com aquela sensação de ‘roubei um
tênis de alguém’. Pelo visto ela estava caminhando ainda mais devagar que eu.
A sorte foi que,
no trajeto deste dia, é possível conhecer uma pequena hermita, afastada 2 km do
Caminho. Disseram-me que valia muito a pena, que o lugar tinha uma energia
especial. Fui. 4 km extras. Não foi fácil pois, apesar do tênis novo, meu pé
continuava machucado e ainda doía por dentro. Mas valeu a pena. A pequena
igreja era linda, tinha uma energia boa demais e caminhar em meio a oliveiras
também foi muito legal.
De volta à
trilha principal, fiquei na esperança de que Hwang não tivesse ido à hermita e
que pudéssemos nos encontrar no Caminho. Nada.
Na próxima
cidade (Punta de La Reina),
resolvi verificar se Hwang estava nos albergues, eu ainda caminharia mais um
pouco até Cirauqui. Primeiro albergue. Nada. Fui até o alguergue municipal e... SIIMM!! Ela estava lá!
Assim que a vi, dei-lhe um grande abraço, recebido com um pouco de desconfiança
e uns tapinhas nas costas. Agradeci e ela falou que o tênis era meu, que eu
podia ficar com ele. Que alegria, que inacreditável!
Nisso eu percebi
que ela estava descalça, afinal, aquele era o tênis que ela usava nos albergues. Já
havia pensado sobre isso durante o dia e ofereci, então, o meu tênis em troca. Ela
não quis aceitar, disse que eu precisaria do tênis depois. E eu não sabia se Hwang
falava a verdade ou se ela não queria por ser um tênis bem velho e sujo.
Insisti. Falei que esse tênis não me serve AGORA. E que eu nem sabia se um dia
iria servir. Na verdade, eu nem sequer queria tentar usá-lo novamente. Além disso, ele
seria um peso morto, desnecessário, demais para eu carregar.
Então falei para
ela: “Vamos ver o que vai acontecer. Eu não preciso deste tênis agora e você
está aí, descalça, precisando de um calçado. Se eu precisar dele de novo,
certamente nos encontraremos algum dia, o Caminho vai dar um jeito de nos
colocar juntas para trocarmos nossos tênis mais uma vez. Só vou ficar com esse
tênis se você realmente não quiser”.
Hwang pegou o
tênis e abriu um sorriso sincero e feliz.
Segunda grande
troca do caminho, mais um desapego. Que loucura! Em poucos dias de caminhada, eu
havia trocado as coisas mais importantes do caminho, os calçados!! Frio na
barriga, medo, mas ao mesmo tempo entrega. Quando eu imaginei que algo assim
poderia acontecer?
Realmente, esse
problema no pé, na verdade, foi um baita PRESENTE! Uma história que emocionou a
todos e que me sinto privilegiada por ter participado.
Caminhei com
esse tênis (e com o Crocs) até Finisterra, o fim do mundo. E caminho com esse
tênis até hoje. Nunca mais vi Hwang, nem sequer fiquei sabendo sobre ela.
E Hwang, se um
dia, por acaso, você ler isso aqui em algum tradutor coreano, muito obrigada.
De coração! Esse tênis salvou o meu caminho. Além disso, me permitiu, e ainda
permite, contar boas histórias! Um abraço apertado.
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